domingo, 29 de novembro de 2009

De mudança

Mudamos para

http://obrascompletas.wordpress.com/

e há três novos poemas lá para comemorar

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Acabou a luz no centro de São Paulo

De repente, escuridão
procura nas gavetas da cozinha
uma última velha vela
só para depois se espantar
"não tem fósforo em casa"
"acende no fogão"
"o fogão é elétrico"
uma família inteira na janela
brinca de jogar luz na rua
com um par de lanternas giratórias
embaixo, o som do borrão
sem a luz do poste
berros e risos se espalham
não há lei ou juiz
como se amanhã
ninguém fosse se lembrar
posso dizer que não fiz!
uma mulher corre piscando
aprisionada na luz dos faróis
medo de estupro no beco
filho em casa chorando
marido com outra sob os lencóis
na esquina, um único prédio aceso
proprietário endinheirado e iluminado
quando criança, apenas brinquedo importado
ainda não sabe brincar, rico infeliz
passando hora após hora
volta a energia, computador se inicia
digno de gol, gritos de comemoração
não há mais nada para olhar lá fora
a varanda já está vazia
podemos voltar a nossa própria escuridão

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

um homem sem paixão ou tristeza
que não sente ternura ou pavor
não atinge a desejada proeza
de se tornar exímio escritor

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

constipado

os papéis se acumulam em pilhas
ja não existe razão para ler
muitas pessoas para pedir perdão
mas não sei por que o fazer
tantos desejos antigos a se dissipar
com a descoberta de que não se mantém
quando estão próximos de se realizar
enfim, estou preso, e não sei em quê
sem incomodo que me motive a reclamar
sem nada que cause interesse para clamar
na calçada em que muitos passam céleres
ando sem afobação, só por caminhar
deixo me levar, sem intenção
quando chego no final do além
não busco uma saída, apenas torno
sigo ainda mais adiante
as pessoas que passam atraem o meu olhar
procuro perguntar se há um motivo para correr
porque eu já não tenho pressa
não percebo o medo de morrer
no entanto, essa espinha em minha garganta
trespassa-me, impossibilita a fala
só me resta observar
para trás olho constantemente
contemplando o tempo perdido
mas é difícil a noção de perder
quando não se sabe o que é ganhar

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Vagão

não apenas o lê, o vive
procura raciocinar como ele, ser como ele
sentir
quando é, enfim, o fim
e as últimas linhas foram traçadas
as últimas notas foram tocadas
não é assim que tudo se deu
não fora você que se transformara
fora ele que se transformara em você
enquanto se vai, em seu encalço
engatado, como um último vagão solitário
que desacelera enquanto o restante do trem segue
está um tanto seu, um tanto dele
tanto faz, não importa mais
um vagão a menos não deixa mais leve
perpetua um vazio

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Krieg ist krieg und schnaps ist schnaps

Li o livro "As Benevolentes", são as memórias de um oficial nazista criado pelo escritor francês Littell*. Minha mãe ganhou o livro de um amigo e o encostou, fui ler a sinopse e achei interessante, apesar do meu preconceito besta contra best-sellers. Acho que essa repulsa a tudo que faz sucesso é uma tentativa de não se achar normal, comum, apenas mais um, superficial, etc, mas essa é uma história pra outra hora.
Voltando ao livro, apesar de críticas negativas quanto à veracidade de alguns fatos históricos e a possibilidade de distorção dos fatos** por se tratar de uma ficção - como se uma memoir ou um trabalho jornalístico não o fizesse - eu gostei do livro. Ele me ajudou a mudar um pouco de paradigma, aceitar algo que eu já tinha como uma ideia na mente, mas que ainda não era totalmente aceita. Acredito que isso ocorra mais do que imaginamos, ouvimos algo diversas vezes que achamos que está certo, repetimos, mas, no fundo, não acreditamos verdadeiramente até que algo de substancial mude.
Bom, vamos ao tal paradigma. Não tenho dúvidas que a Segunda Guerra foi o maior marco na nossa história recente, isso se reflete na quantidade de livros, filmes e obras em geral que abordam essa temática. Muitos, inclusive, reclamam e choramingam não aguentar mais do mesmo, entretanto eu acredito que, pela dimensão do que representou, é totalmente aceitável. Ademais, a quantidade de obras que tratam a Segunda Guerra só mostra que ainda não entendemos completamente esse evento e ainda o rodeamos a procura de uma explicação nova; isso porque julgamos a Endlösung - Solução Final - algo inexplicável, de tamanha crueldade que não parece cabível ao ser humano.
Porém, na minha concepção, é justamente nesse pensamento que mora o erro. Um comportamente desse tipo é cabível ao homem. Quanto era menor, na minha pré-adolescência, adorava o militarismo, queria me tornar um oficial, seguir carreira, achava o nacionalismo a maior das virtudes, como podem ver, não batia muito bem; porém, mudei, mas meu interesse por Guerras continuou, por outra perspectiva, claro. Na época, como muitos outros, acreditava que a Segunda Guerra teria sido a última guerra honrada, na qual se sabia claramente o lado por qual você deveria lutar. Era o bem contra o mal. Será? Veja, não estou aqui defendendo o Nazismo, embora, conhecendo os leitores da internet como eu conheço, acredito que é bem capaz que alguém me acuse disto. Aqui eu não planejo discutir se o extermínio dos judeus - e ciganos, poloneses, homossexuais, etc - era errado, todos sabem esta resposta, mas sim se aqueles nazistas eram malignos. Afinal, o que poderia ter levado um homem a esse estado? Uma possessão demôníaca, a princípio, parece a melhor explicação, entretanto, o que levou milhares de homens a agirem assim na década de 40 e outros milhões de homens em todas as outras décadas de todos os séculos é algo muito mais comum e menos sobrenatural: a natureza humana.
O que digo não é novidade, muitos chegaram a essa conclusão antes da guerra - Freud, por exemplo - e muitos outros, assombrados e se perguntando como aquilo aconteceu, procuraram a resposta no pós-guerra, em destaque Adorno, que realizou pesquisas sobre a personalidade autoritária. Todavia, meu objetivo tampouco é me aprofundar nessas ideias, pelo menos por enquanto, sou muito caro a elas, contudo às vezes podemos chegar a resultados semelhantes de métodos mais simples. Foi o que aconteceu comigo, talvez lendo tais autores e outros eu concordasse, mas foi o livro de Littell que me fez incorporar esta concepção.
No livro, o personagem principal, Maximilen Aue, oficial da SS, em certo momento conhece o médico chefe do campo de concentração de Auschwitz, Eduard Wirths, superior de Mengele - o médico que fazia experimentos sinistros e fugiu pro Brasil, morrendo afogado em Bertioga em 79 -, Aue o pergunta qual é a causa, na opinião do médico, do sadismo crescente e desnecessário dos guardas no campo de concentração. Wirths o responde que uma justificativa comum dada pelas pessoas seria a propaganda nazista, que tentava convencer os nazistas de que os judeus não eram humanos e não mereciam respeito. Algo contra essa tese seria a constatação de que aqueles homens não agiam com tamanha crueldade com os animais e estes também não eram humanos. O que acontecia era justamente o contrário, os soldados inicialmente pensavam acreditar na teoria de que os prisioneiros eram subumanos, mas, quanto mais contato tinham, mais percebiam que aqueles homens em uniformes listrados eram iguais a eles. Por isso, batiam, espancavam, tentando fazer com que aquele homem capitulasse a sua condição de humano, até que vinha o assassinato, a comprovação do fracasso do guarda em extirpar a humanidade do outro.
De algum modo, funcionamos mais ou menos como aqueles guardas da SS. Olha-se para eles e se julga que um humano não seria capaz daqueles atos, então eles passam a ser a encarnação pura do mal, como ele nunca poderia existir. A realidade é outra, e é dura, por trás dessa imagem que tentamos pintar se esconde uma profunda identificação, o nazista ali poderia ser qualquer um. O horror não é tão grande e nem tão distante quanto queremos que pareça. Do mesmo modo como o acaso fez um cidadão alemão ser classificado para exterminar judeus enquanto outro cidadão alemão era encarregado de, digamos, distribuição de alimentos, também foi o acaso que me fez acompanhar esse livro; muitas coisas, se não todas, dependem do acaso, assim como o bem e o mal.
A narração de Litell é muito bem construída e belíssima, além de nos fazer refletir a respeito de temas fundamentais. Vejo agora que alguns críticos acusaram-no de banalizar o mal, estes, crias da ignorância voluntária, não entenderam nada.


*agora descubro que ele é americano naturalizado francês
**agora descubro que ele foi criticado nesse aspecto por uns e exaltado pela veracidade histórica por outros

domingo, 13 de setembro de 2009

lagartixa

No começo do ano uma lagartixa estava morando no meu banheiro, acabei abortando um banho para escrever isso, não lembro mais se publiquei isso aqui, qualquer coisa vai de novo:


Lagartixa do rabo empinado
olhar assombrado
voltado para mim
querendo, talvez, ficar ao meu lado
será que está apaixonada por mim?